17/02/08

responsabilidade civil extracontratual de entes públicos

A Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro, que aprovou o "novo" regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entes públicos podia e devia, a meu ver, ter ido mais além. Não obstante, clarificaram-se algumas matérias e deram-se já alguns passos em frente, o que não deixa de ter a sua importância.
É de salientar o que prescreve o art.º 4.º desta lei, a propósito da culpa do lesado. Aí se diz que "quando o comportamento culposo do lesado tenha concorrido para a produção ou agravamento dos danos causados, designadamente por não ter utilizado a via processual adequada à eliminação do acto jurídico lesivo, cabe ao tribunal determinar, com base na gravidade das culpas de ambas as partes e nas consequências que delas tenham resultado, se a indemnização deve ser totalmente concedida, reduzida ou mesmo excluída.". Ora, um dos exemplos que me salta logo à mente é o da pessoa (singular ou colectiva) que vê uma obra sua embargada e que, não obstante, continua a construir sem impugnar o acto administrativo que embargou a obra ou sem obter previamente uma decisão judicial que suspenda o embargo decretado (caso tenha sido tomada a resolução fundamentada a que alude o art.º 128.º, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, a suspensão do acto por mero efeito da instauração de uma providência cautelar, por exemplo, recua, permitindo a resolução fundamentada que se inicie ou prossiga a execução do acto). Os exemplos poderiam multiplicar-se. O que importa reter é que, caso alguém tente assacar responsabilidade civil extracontratual a uma entidade à qual se aplique o diploma em apreciação, a sua conduta face ao acto administrativo praticado ou aos factos produzidos será apreciada como possível causa de exclusão ou redução da responsabilidade da entidade cuja conduta ou acto originou o dano.
Outra prescrição importante desta lei é a do art.º 1.º, n.º 5, que estende expressamente o regime da responsabilidade das pessoas colectivas de direito público por danos decorrentes do exercício da função administrativa às pessoas colectivas de direito privado e respectivos trabalhadores, titulares de órgãos sociais, representantes legais ou auxiliares, por acções ou omissões que adoptem no exercício de prerrogativas de poder público ou que sejam reguladas por disposições ou princípios de direito administrativo. É o caso de uma sociedade anónima, que actue de acordo com o direito privado e com o direito público, que integre o sector empresarial do Estado.
A par da responsabilidade civil por danos decorrentes do exercício da função administrativa, onde se regula a responsabilidade por facto ilícito e a responsabilidade pelo risco, prevê-se ainda a responsabilidade por danos decorrentes do exercício da função jurisdicional, por danos decorrentes do exercício da função político-legislativa e a indemnização pelo sacrifício.
Quanto a esta última, que não se aplica às pessoas colectivas de direito privado de que falámos anteriormente, trata-se de situações em que são impostos encargos ou causados danos especiais e anormais a particulares por parte do Estado ou outras pessoas colectivas de direito público, por razões de interesse público. Nestes casos, o particular afectado tem direito a ser indemnizado. Estes danos ou encargos vêm também definidos nas disposições gerais deste novo diploma legal, afirmando o legislador que são aqueles que incidem "...sobre uma pessoa ou um grupo, sem afectarem a generalidade das pessoas...", sendo considerados danos anormais aqueles que "...ultrapassando os custos próprios da vida em sociedade, mereçam, pela sua gravidade, a tutela do direito".
Muitíssimo mais haveria, com certeza, a dizer, mas ficam aqui algumas notas para reflexão.

2 comentários:

Anónimo disse...

Antes demais aproveito para agradecer a existencia deste blogue. Sendo esta Lei nova convém ler o livro Responsabilidade Civil Extra-Contratual do Estado de Luis Cabral de Moncada onde temos uma noção mais alargada do referido diploma.

Cumprimentos

Paulo Santos

Joana Roque Lino disse...

Olá, Paulo Santos,
Muito obrigada pela sua visita e pela preciosa indicação que nos deixa. Assim que tiver oportunidade, vou procurar o livro. Até à próxima.